Do Brasil à Mesa: Um Case de UX/UI Design e Identidade Gastronômica Brasileira
23 de set. de 2025
Mais do que um marketplace, o DBM é um ecossistema que promove identidade cultural, pertencimento e visibilidade para produtos típicos como queijos artesanais, chocolates, vinhos coloniais e mel de melato.
Resumo executivo
Alcance: 1,3 mil usuários ativos e 1,3 mil novos usuários (mar–set/2025).
Redesign: nova arquitetura, fluxos de cadastro e curadoria, design system “brasileiro” e storytelling por biomas.
Impacto esperado: ↓ erros (404), CTR > 2%, ↑ retenção de produtores/chefs e ↑ descoberta orgânica.
Base de pesquisa: entrevistas com produtores (AM/PR/RR), jornada e dores, benchmark de mercado, event storming e requisitos funcionais da curadoria.
1. Contexto do Desafio
O Do Brasil à Mesa (DBM) é uma plataforma digital criada em parceria com o Sebrae Nacional para valorizar a gastronomia brasileira e conectar produtores artesanais, chefs e compradores B2B. A iniciativa surgiu com o propósito de ser mais do que um marketplace: uma vitrine de identidade e cultura, que une tecnologia, tradição e território.
O projeto se propôs a resolver um desafio central: como transformar a diversidade alimentar do país em uma experiência digital acessível, educativa e confiável, especialmente para pequenos produtores com pouca familiaridade tecnológica.
O cliente era o próprio Sebrae, que buscava uma solução escalável para dar visibilidade aos produtos de origem diferenciada — queijos artesanais, farinhas regionais, polpas amazônicas e doces típicos — e fortalecer cadeias produtivas locais. O usuário principal era o pequeno produtor ou microempreendedor (MEI), que desejava expor seus produtos e alcançar novos mercados, mas enfrentava barreiras como falta de conhecimento técnico, dificuldades em criar uma loja virtual e pouca visibilidade fora do próprio município.
Além dos produtores, havia outros dois perfis de usuário fundamentais:
O curador Sebrae, responsável por validar cadastros de produtos e empresas com base em critérios técnicos e legais.
O comprador B2B, geralmente chefs e lojistas, que desejavam encontrar produtos típicos e de procedência confiável.
O objetivo do usuário era claro: ser reconhecido e divulgado. Ele queria criar sua vitrine, contar sua história, conquistar novos compradores e, principalmente, sentir orgulho de ver seu produto representando seu território.
Meu papel como Senior Product Designer foi conduzir a pesquisa de experiência (UX Research), mapear jornadas e dores reais, liderar o redesign da plataforma e desenvolver um sistema de design inclusivo e escalável, que refletisse a brasilidade do projeto e simplificasse a experiência de uso. O plano envolveu três eixos principais: descobrir as causas das fricções, redesenhar a arquitetura e validar as soluções em protótipos de alta fidelidade com usuários reais.
2. Racional do Processo
A motivação para o redesign surgiu após a análise dos relatórios de Google Analytics, que mostraram um paradoxo: 1,3 mil usuários ativos e 197 mil visualizações de páginas, mas apenas 0,26% de taxa de cliques e mais de 3,2 mil erros 404. Isso evidenciava que as pessoas tinham interesse pelo conteúdo, mas não conseguiam completar as ações esperadas — o que indicava falhas de usabilidade e navegação.

A fase de discovery foi conduzida para compreender as razões por trás dos comportamentos observados. Foram realizadas entrevistas em profundidade com produtores de diferentes regiões do país. Um dos participantes mencionou desafios logísticos e a necessidade de fortalecer a presença digital. Outro destacou que o cadastro na plataforma não resultou em retorno comercial. Já um terceiro avaliou o processo como intuitivo, mas apontou lentidão na curadoria e a ausência de dados sobre os negócios gerados.

Essas conversas trouxeram clareza sobre as fricções reais: produtores se sentiam sozinhos e desmotivados no processo; o feedback das curadorias era impessoal; e não havia mecanismos de acompanhamento ou divulgação pós-aprovação.
No benchmarking, comparamos o DBM a plataformas como Local.e, Connecting Food e Goola. A principal diferença estava no foco: enquanto os concorrentes priorizavam rastreabilidade e controle corporativo, o DBM precisava ser emocional, educativo e inclusivo, valorizando a cultura e o território.
Com base nas entrevistas e nos fluxos mapeados com Service Blueprint e Event Storming, definimos as principais oportunidades de design:
Simplificar o cadastro e torná-lo mais pedagógico.
Criar feedbacks humanizados e orientativos.
Oferecer uma jornada pós-aprovação com incentivo à divulgação.
Estruturar uma curadoria mais rápida, com painéis e filtros automatizados.
Dar visibilidade aos resultados e conexões comerciais criadas pela plataforma.
O redesign da experiência foi guiado por uma lógica centrada em inclusão digital. Desenvolvemos um fluxo de onboarding em etapas, com salvamento automático e exemplos visuais em cada campo. Criamos um painel de curadoria interativo com filtros por estado, categoria e selo de qualidade. E, ao final, uma tela de sucesso convidava o produtor a divulgar sua vitrine com botões para WhatsApp e QR code — traduzindo o sucesso da jornada em ação.

O design system foi inspirado nos biomas brasileiros, trazendo cores e ícones regionais, reforçando a identidade cultural sem perder clareza visual. A tipografia legível e o contraste elevado garantiram acessibilidade, especialmente no mobile, onde a maior parte dos produtores acessava a plataforma.

Por fim, instrumentamos novos eventos no Google Analytics — como form_step_complete, curation_decision, publish_success e share_click — para monitorar com precisão o impacto das mudanças e medir o sucesso da jornada completa.
3. Resultado dos Testes
Os testes de usabilidade foram realizados em duas frentes principais: produtores e curadores Sebrae. O objetivo era medir o nível de clareza, tempo de execução das tarefas e sensação de controle durante o fluxo.
Com os produtores, observamos que a principal barreira era o medo de errar. Ao introduzir o formulário em etapas, as dúvidas diminuíram e os participantes relataram sentir-se mais seguros. O tempo médio para concluir o cadastro completo caiu significativamente nas simulações. O uso de exemplos visuais e microtextos claros ajudou a eliminar termos técnicos e reduzir erros.

Do lado da curadoria, o novo painel de aprovação substituiu planilhas dispersas e e-mails informais. Agora, os curadores podiam aplicar filtros inteligentes e deixar comentários padronizados com orientações de correção. O processo tornou-se mais ágil, transparente e colaborativo.
Durante os testes, algumas melhorias adicionais foram identificadas: o formulário ainda exigia ajustes na ordem dos campos e o feedback visual de carregamento precisava ser mais evidente. Corrigimos esses pontos com iterações rápidas de protótipo e feedback contínuo dos usuários.
Os resultados foram promissores: a experiência tornou-se mais fluida e satisfatória, com menos abandono e mais clareza. Ainda que os dados pós-implementação estejam em fase de coleta, as metas definidas são objetivas e mensuráveis:
Elevar a taxa de cliques (CTR) de 0,26% para acima de 2%.
Reduzir em 80% os erros 404.
Diminuir o tempo de aprovação por parte da curadoria.
Implementar a telemetria de negócios, medindo quantos contatos e vendas B2B surgem pela plataforma.
O Do Brasil à Mesa evoluiu de uma vitrine estática para um ecossistema ativo de conexão e visibilidade. O projeto mostrou que design é ponte entre cultura e tecnologia, capaz de traduzir a riqueza gastronômica brasileira em uma experiência digital acessível, orgulhosa e humana.

Conclusão
O Do Brasil à Mesa representa um marco na convergência entre design, cultura e impacto social. Mais do que um projeto digital, ele é um movimento de valorização da gastronomia brasileira — um espaço onde o design atua como agente de inclusão, traduzindo a diversidade dos territórios e das histórias dos produtores em uma experiência simples, humana e inspiradora.
O processo mostrou que projetar para públicos com baixa maturidade digital exige empatia e pedagogia. Cada tela, cada texto e cada interação precisou ser pensado não apenas para resolver uma tarefa, mas para ensinar e empoderar o usuário a usar a tecnologia em benefício próprio. Essa abordagem educacional tornou-se o grande diferencial do projeto, reforçando o propósito do Sebrae de democratizar o acesso à economia digital.
O redesign transformou a plataforma em um ecossistema vivo, capaz de conectar produtores, curadores e compradores de forma orgânica. O novo fluxo de cadastro reduz a ansiedade e aumenta a confiança. O painel de curadoria humaniza o processo de aprovação. E o storytelling gastronômico, com chefs e produtos regionais, aproxima as pessoas da riqueza cultural brasileira.
O projeto também estabeleceu uma nova forma de medir sucesso: menos centrada em cliques e mais em conexões reais. Cada lead gerado, cada produto aprovado e cada história contada refletem o verdadeiro impacto do design no fortalecimento de comunidades locais.
Como Senior Product Designer, minha maior realização neste projeto foi ver o design deixar de ser uma camada estética e se tornar uma ferramenta estratégica de transformação. O Do Brasil à Mesa consolidou-se como uma vitrine digital que honra as origens, celebra a autenticidade e cria oportunidades — mantendo, de forma simbólica e prática, o Brasil inteiro à mesa.
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